Trazer a espiritualidade para a empresa apresenta-se-nos como o novo desafio da gestão do século XXI, implicando a mudança de um paradigma orientado predominantemente para o lucro, e para uma cultura materialista e egoísta em termos de distribuição de riqueza, para um paradigma de gestão sustentado em propósitos mais espirituais e altruístas.
«A espiritualidade pode aumentar o potencial intuitivo e criativo dos colaboradores, fomentar a honestidade e a confiança entre os membros organizacionais e entre eles e os ‘stakeholders’, aumentar o sentido de realização pessoal dos indivíduos, assim como melhorar o empenhamento dos colaboradores na organização e promover o desempenho organizacional.» Sukumarakurup Krishnakumar/ Christopher P. Neck (2002)
O conceito de ‘persona’, étimo latino da palavra pessoa, em regra referente a um ser humano (homem ou mulher), enquanto ser consciente, responsável e possuidor de livre arbítrio, tem vindo a sofrer no domínio específico da gestão (tal como em muitos outros domínios científicos) múltiplas vicissitudes e ajustamentos, fruto das lógicas paradigmáticas vigentes em cada época.
A lógica instrumental e reducionista da «mão-de-obra», expoente máximo do pragmatismo que caracterizou o paradigma economicista, cerceou e inibiu na ‘persona’ as capacidades mais elevadas do espírito humano. Controlo, tarefa e obediência com vista ao aprimoramento da técnica e ao mecanicismo profissional foram instrumentos máximos da gestão de «pessoal». Numa lógica inversa, fala-se hoje de gestão de pessoas de uma forma integrada e holística, atendendo às suas capacidades emocionais, cognitivas e humanas, quer enquanto indivíduos, quer na sua relação com os outros, no respeito pela sua livre expressão, pela liberdade de decisão e pelas necessidades, as quais abrangem cada vez mais o domínio da espiritualidade entendida enquanto significado, sentido, propósito, vida interior e comunidade. Resgatar a plenitude da dimensão humana apresenta-se-nos, pois, como um imperativo do nosso tempo, e é transversal a todas as áreas das nossas vidas. É um facto que assistimos já a profundas transformações nas organizações, de entre as quais ressalta o esbatimento da separação entre a vida profissional e a vida pessoal e, dentro desta, a vida interior de cada um. Por um lado, as pessoas procuram cada vez mais viver uma vida com significado, sentirem-se bem consigo próprias, com o que fazem, e contribuírem, de uma forma mais global, para a sociedade, para o bem comum. Por outro lado, as organizações parecem começar a perceber que propiciar aos seus colaboradores ambientes profissionais espiritualmente ricos maximiza os seus níveis de confiança, de motivação e de comprometimento, podendo produzir impactos profundos ao nível dos seus desempenhos organizacionais.
Trazer a espiritualidade para a empresa apresenta-se-nos, pois, como o novo desafio da gestão do século XXI, implicando a mudança de um paradigma orientado predominantemente para o lucro, e para uma cultura materialista e egoísta em termos de distribuição de riqueza, para um paradigma de gestão sustentado em propósitos mais espirituais e altruístas, orientados para o respeito pelo ser humano, pelo meio ambiente, pela ética, pela transparência, pela confiança e pela cooperação nas relações. Um ambiente organizacional espiritualmente rico oferece a cada momento energia positiva, flexibilidade, polivalência, oportunidades de comunicação, negociação, ensino e aprendizagem, desenvolvimento pessoal e profissional, harmonia, convivência, desenvolvimento da criatividade individual e colectiva, trocas múltiplas, ganhos e perdas…
O papel da liderança é, pois, fundamental para a implementação desta filosofia nas empresas. A cultura organizacional, as políticas da organização e as práticas devem reflectir e evidenciar o respeito pelo ser humano na sua totalidade e em todas as suas dimensões (física, intelectual, emocional e espiritual), e o líder deve ele próprio dar o exemplo, quer do ponto de vista pessoal, quer do ponto de vista organizacional, não tendo qualquer pejo em assumir que participa ativamente no seu dia-a-dia – nas dinâmicas organizacionais ou nas rotinas e atividades domésticas com a sua família.
Atendendo à importância crescente que a espiritualidade no local de trabalho tem atingido nos últimos tempos, inúmeras empresas implementaram já um conjunto de práticas internas enquadradas em programas de qualidade de vida organizacional, que visam proporcionar o bem-estar dos seus colaboradores. São disto exemplo exercícios de relaxamento, facilitação da prática de exercício físico em contexto organizacional, ‘pilates’, ‘yoga’, música, dança, programas de apoio à gestão da diversidade, programas de saúde e educação alimentar, meditação, ‘reiki’ e outros.
Um outro exemplo muito em voga consiste na prática de ‘mindfulness’, a qual é utilizada em grandes empresas como a Google, por executivos de topo como William Ford (da Ford Motor Company), ou ainda por atletas e celebridades para gerir situações de enorme tensão e ‘stress’, socorrendo-se da serenidade a que a prática permite aceder.
O trabalho e o local de trabalho são hoje encarados como espaços de realização pessoal, social e comunitária, estando em causa nesta relação do indivíduo com o trabalho e com o local de trabalho muito mais do que a mera retribuição monetária. Ora, sendo as organizações compostas por pessoas, o desafio que se apresenta aos líderes de hoje é o de melhorarem a imagem interna da organização, propiciando climas favoráveis ao desenvolvimento, à realização e ao bem-estar dos seus colaboradores, na convicção de que tais melhorias conduzirão a maior empenho, produtividade e compromisso, e consequentemente a melhores performances organizacionais.
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